quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Personagens negros na Bíblia.



Por João Deyvid;

Reflexão sobre a importância da África dentro do contexto bíblico, e análise da contribuição dos povos negros para o crescimento da mensagem cristã.

O continente Africano é o berço da humanidade e também, o das civilizações; no século XVIII, após a decifração da pedra roseta tomamos conhecimento que praticamente todo conhecimento científico e filosófico da sociedade ocidental teve origem no Egito, ou seja, na África.
Porém a África ainda hoje é um continente desconhecido para a maioria da população Brasileira, as escolas, igrejas e meios sociais não estudam a história africana, mesmo que este passado esteja tão presente em nosso dia a dia, seja pela língua, pela cultura, pelas religiões e etc.
Em nossa cultura o Cristianismo é o movimento religioso que reúne mais adeptos, e o mesmo é contrário a idéias de supremacia racial e consequentemente contra o preconceito, então você pode se perguntar: se o cristianismo não faz acepção de cores, onde estão os personagens bíblicos negros? -uma pergunta pertinente!- “Em toda a Bíblia onde sempre estiveram”-seria a resposta mais exata - talvez você nunca os tenha percebido; por uma questão cultural, infelizmente temos uma visão “Eurocêntrica” da história e da religião, essa visão européia excludente nos impede de perceber as diferentes contribuições Multi-étinicas e culturais, o que propicia uma desvalorização de nossa identidade Afro-descendente.
Hoje ainda insistem em exibir um Cristo de traços europeus, anjos loiros, profetas brancos, que a igreja Católica criou, para garantir a superioridade e o poder das etnias claras que dominavam o mundo na Idade Média.
Você já pode ter ouvido falar que foram os europeus que levaram a Bíblia para a África! Mas a Bíblia é um livro afro-asiático e se lermos com atenção perceberemos que quase toda a historia do Êxodo se passa na África, especificamente no Egito, o faraó e sua corte, portanto eram negros, apesar de todos termos conhecimento de que o Egito fica na África nunca paramos para pensar nesses personagens como negros de fato.
A seguir veremos alguns dos vários personagens negros que compõem a história bíblica:
José se casou com uma mulher etíope/negra (Gênesis 41:50-52), e os seus dois filhos (Manassés e Efraim) se tornaram líderes de tribos judaicas.
Moisés, profeta que levou os Israelitas à terra prometida casou-se com a filha de Jetro, Zípora (Êxodo 2: 21) uma africana que foi posteriormente discriminada por Miriam (irmã de Moisés) e por esse ato de preconceito Deus castigou severamente a Miriam (Números 12: 1-12). É importante lembrar que Deus no Antigo Testamento proibiu o casamento entre algumas etnias, não por causa da origem e sim pela religião pagã que esses estrangeiros seguiam, mas permitiu que os israelitas casassem com mulheres cusitas/etíopes ( negras) Êxodo (34: 11 e 16). Há diversas passagens Bíblicas que demonstram que Deus mantinha uma relação única com os etíopes, assim como mantinha com os Israelitas: “Não me sois, vós, ó filhos de Israel, como os filhos dos etíopes?” (Amós 9:7), “Príncipes virão do Egito; a Etiópia cedo estenderá para Deus as suas mãos” (Salmo 68:31).
“Dalém dos rios da Etiópia, meus zelosos adoradores, que constituem a filha dos meus dispersos, me trarão sacrifícios”. (Sofonias 3:10); Deus classificou os etíopes como “zelosos adoradores” o que demonstra a obediência desse povo;“E há de ser que naquele dia o Senhor tornará a pôr a sua mão para adquirir outra vez o remanescente do seu povo, que for deixado, da Assíria, e do Egito, e de Patros, e da Etiópia, e de Elã, e de Sinar, e de Hamate, e das ilhas do mar. (Isaías 11:11)
É interessante ressaltar que assim como Israel, a África também tinha conhecimento do Deus bíblico e era visto pelo Próprio Deus como povo fiel, é possível ver hoje que Alguns povos africanos possuíam o conhecimento da história bíblica, isso se torna evidente em um conto africano que narra a criação do mundo pelo Deus “tri uno” que tinha três nomes e três manifestações Nzamé, Merebe, Nkwa, (respectivamente Pai, Filho, Espírito Santo) história essa contada a mais de 3 mil anos na Região de Uganda*, percebe-se aí que Deus já era adorado por outros nomes e por outra cultura, muito antes do contato com o povo Europeu.
*Ver texto em anexo (A criação do Mundo/ lenda africana).
Os judeus Falasha Etíopes, que vivem na Etiópia e Israel reivindicam a descendência direta de Abraão (Patriarca Árabe), pois a Matriarca dos árabes era uma Africana', do Egito, chamada 'Agar'. (Gênesis 21: 8).
Uma análise do Canto de Miriam (Ex 15: 19-21), que compõe um dos textos mais antigos de toda a Bíblia, nos permite notar a proximidade da cena com a rica cultura dos povos negros: canto e dança ao redor dos tambores, claramente estavam praticando costumes africanos que adquiriram durante o tempo em que viveram no Egito.
A maior parte dos etíopes traça as suas raízes à rainha de Sabá, esposa mais amada de Salomão, a bíblia diz que ela tinha a pele escura “como as tendas de quedar” (Cantares 1: 5), as tendas de quedar eram feitas da lã mais negra ressaltando também que o livro de cantares, um livro dedicado ao amor foi escrito pelo Rei Salomão em homenagem a ela, e desse amor nasceu Meneleque (seu filho preferido), é interessante perceber como há tempos temos evidências como essas na bíblia, que passam quase imperceptíveis, em detrimento de uma visão “viciada” em não valorizar o negro.
Mas os personagens bíblicos negros não se resumem só a coadjuvantes das histórias bíblicas, temos também Profetas afro-descendentes como Sofonias, que era um negro descendente de Cush/ Cusi (região africana) Sofonias (1:1).
Por contrariar os interesses da corte de Jerusalém, pouco antes da destruição da cidade, o profeta Jeremias foi preso e lançado numa cisterna, um africano, funcionário do rei (Ebed-Melec, significa “ministro do rei”), liderou um movimento para libertar Jeremias (Jeremias 38,1-13) fato esse também “inocentemente” ignorado por muitos teólogos.
Os evangelhos são unânimes em afirmar que um certo Simão de Cirene ajudou Jesus a carregar a cruz, a caminho do Calvário (Mt 27.32; Mc 15.21; Lc 23. 26). Ora, Cirene fica no norte da África, mas alguma vez você ouviu falar em um sermão que um africano ajudou Jesus a carregar a cruz? “Coincidentemente” esses detalhes são esquecidos de ser mencionados, o que contribuiu/contribui para uma visão Afropessimista, mesmo dentro das religiões.
Os Cirênios repartiram o evangelho com os gregos filhos de Jafé (Atos 11:20). Nitidamente os africanos já conheciam a palavra de Deus: o missionário Filipe, ao “aceitar a carona” na carruagem do negro e alto funcionário de Candace, rainha da Etiópia, tem uma grata surpresa: o africano já tem em suas mãos o livro do profeta Isaías (Atos 8: 26-40).
A igreja católica muito colaborou para uma visão branca da Bíblia com seus afrescos, e pinturas renascentistas, onde cenas Bíblicas eram retratadas com imagens de pessoas brancas de bochechas rosadas, como por exemplo, a capela Cistina, mas existem pinturas com mais de 1500 anos na Etiópia que já retratavam Jesus e alguns de seus discípulos como negros.
É um fato indiscutível de que o cristianismo experimentou um estabelecimento inicial e frutífero na África do Norte, Egito e Etiópia. Poderia haver dentre os apóstolos algum negro? A Bíblia nos revela que sim, pois o Apóstolo Paulo em um caso de erro de identidade foi classificado como Egípcio (Atos 13: 2,3), se Paulo fosse branco não teria sido confundido com um egípcio, negro.
Além de Paulo há a possibilidade de Simão, o Zelote (palavra equivalente a Cananita) ser também um apóstolo negro (Mateus 10:4), pois os Cananitas eram negros, e sofreram grande preconceito, por causa da igreja medieval que criou a teoria de que teriam a pele escura por causa de uma maldição que Nóe lançou sobre Cam (ascendente dos Cananitas); e por esse motivo deveriam ser escravizados. Por não conhecer a “Africanidade” de muitos heróis Bíblicos, ou por ignorar propositalmente é que se permitiu a criação de teorias racistas como essa dentro de uma religião que se denomina cristã.
Um documentário da BBC de Londres recentemente levantou e defendeu a hipótese de Jesus ter sido negro, esse documentário causou muita polêmica na Europa, o interessante é que ninguém tem provas conclusivas da cor de Jesus, mas todo mundo aceita quando alguém diz que ele era branco ou o representa como tal, ninguém questiona o fato de ele ser muitas vezes representado com cabelos claros e olhos azuis (aparência essa que jamais poderia ter, pois era um Judeu), por outro lado é só dizer que ele poderia ser negro que as pessoas começam a questionar, isto é com certeza uma forma de externar a discriminação racial, que em nada se encaixa com os valores cristãos...continua
Quem desejar a matéria na íntegra, é só deixar um comentário com e-mail.
e-mail: joao.deyvid@hotmail.com

A questão Étnica e o racismo hoje!



Reupado a pedidos!
Por: João Deyvid;


Aqueles que me conhecem ou mantém contato comigo via web sabem que um tema recorrente de minha verborragia é a questão étnica, as relações etno-sociais, o Racismo e suas implicações, políticas, psicológicas e etc, esta discussão se mostra redundante em meu diálogo em decorrência de sua importância e do peso que esta tem sobre a sociedade, que na maioria das vezes fecha os olhos para esta problemática, é mais cômodo fingir que a questão da discriminação em nosso País é social, ou fruto de um sentimento de inferioridade do individuo negro, porém para aqueles que dedicam parte de seu tempo para um estudo sociológico, ainda que tenha como ferramenta de estudo o senso comum, fica visível um sistema excludentesegregador e explorador em nossa sociedade que tenta manter a sociedade negra estagnada e a margem dos direitos da pessoa humana, mas para adentrarmos no viés dessa discussão, temos que fazer alguns esclarecimentos:

Racismo o que é?

O racismo é um preconceito contra um “grupo racial”, geralmente diferente daquele a que pertence o sujeito, e, como tal, é uma atitude subjectiva gerada por uma sequência de mecanismos sociais.
Um grupo social dominante, seja em aspectos econômicos ou numéricos, sente a necessidade de se distanciar de outro grupo que, por razões históricas, possui tradições ou comportamentos diferentes. A partir daí, esse grupo dominante constrói um mito sobre o outro grupo, que pode ser relacionado à crença de superioridade ou de iniquidade.
Nesse contexto, a falta de análise crítica, a aceitação cega do mito gerado dentro do próprio grupo e a necessidade de continuar ligado ao seu próprio grupo levam à propagação do mito ao longo das gerações. O mito torna-se, a partir de então, parte do “status quo”, fator responsável pela difusão de valores morais como o "certo" e o "errado", o "aceito" e o "não-aceito", o "bom" e o "ruim", entre outros. Esses valores são aceitos sem uma análise onto-axiológica do seu fundamento, propagando-se por influência da coerção social e se sustentando pelo pensamento conformista de que "sempre foi assim".
Finalmente, o mecanismo subliminar da aceitação permite mascarar o prejuízo em que se baseia a discriminação, fornecendo bases axiológicas para a sustentação de um algo maior, de posturas mais radicais, como as atitudes violentas e mesmo criminosas contra membros do outro grupo.
Convém ressaltar que o racismo nem sempre ocorre de forma explícita. Além disso, existem casos em que a prática do racismo é sustentada pelo aval dos objetos de preconceito na medida que também se satiriza racialmente e/ou consente a prática racista, de uma forma geral.

Negro Racista?

O indivíduo Negro não pode ser racista, existe aí uma impossibilidade etimológica, um negro (até em auto-defesa contra a sociedade racista ) pode insurgir-se contra os brancos, mas aí teríamos um caso discriminatório e não racista, pois para cometer racismo (não confundir com o ato de discriminação) o sujeito da ação deve estar no topo da escala hierarquíca socio-histórica (como o branco) e do ponto de vista histórico, cultural e social não há efetivamente nenhuma probabilidade de que brancos no Brasil sofram racismo, na definição de racismo vemos que este deve ser seguido de uma série de mecanismos sociais, tal qual a doutrina católica medieval de que o negro não possuía alma, teorias sobre o baixa intelectualidade dos negros, demonização da cultura africana entre outros vários exemplos de ferramentas usadas para criar o afropessimismo (visão pessimista sobre os negros, seus costumes, estética e tradições, teorias criadas para manter o domínio branco em todas as camadas do convívio social e que perdura até hoje).

O mito da democracia Racial

O mito da democracia Racial foi criado pela elite Brasileira como forma de dominação, e arma para manter os negros e a sociedade em geral conformada com a situação do negro, desde o primeiro encontro entre o colonizador português, o escravo africano e o nativo indígena, a fábula das três raças é contada de geração a geração, propagando o fato de que o povo brasileiro é resultante da mistura entre brancos, negros e índios. Essa ideia traz em sua essência a crença de que o Brasil, fruto desta mistura, é um lugar onde as relações ocorrem de forma harmônica e pacífica, em um verdadeiro éden de respeito racial e humano.
Segundo essa tese, a partir da mistura da raça branca (superior) e da raça negra (inferior), haveria um melhoramento da genética dos brasileiros. Este ideal de branqueamento foi incutido na sociedade brasileira ao longo de toda sua história, de tal maneira, que levou o próprio negro à sua auto negação, levando a uma fragmentação das identidades raciais no país.
essa situação possibilitou às elites brasileiras, que comandavam o país, difundir a idéia de que o Brasil era livre de preconceitos e discriminação racial. As circunstâncias histórico-sociais apontadas fizeram com que esse mito manipulasse os mecanismos sociais através da defesa dissimulada de atitudes, comportamentos e ideais aristocráticos da raça “dominante”.
O mito da democracia racial possibilitou que uma das formas mais perversas de racismo se propagasse no Brasil, aquela mascarada pelo status democrático, cuja aceitação e compreensão das diferenças não passam de pura dissimulação.
Alguns estudiosos apontam que este mito teria sido um dos mecanismos de dominação ideológica mais poderosos produzidos no país, tanto que, apesar de toda a crítica que a ele foi feita, o mito permanece bem atual.

Racismo Hoje

Podemos constatar que o racismo é a representação de uma desigualdade étnico-racial que atinge o Brasil de forma vergonhosa e assustadora desde o período colonial. A raça negra foi cruelmente massacrada, humilhada e escravizada com base no racismo. Os livros de história contam detalhadamente os episódios de sofrimento e servidão deste povo, mas não expõem a história da África e do povo negro antes da escravidão. Existe uma grande lacuna a este respeito. Os livros didáticos, na sua grande maioria, dão maior ênfase aos episódios de humilhação e dor ocorridos com os negros no Brasil, mas não relatam as conquistas e como era a vida deste povo, quando em liberdade na África. Vale lembrar que, deste continente, surgiram grandes civilizações. A história desta raça, suas origens, cultura e antepassados, merecem respeito e atenção.A criança negra, na escola, só tem acesso à história de seus antepassados como um povo escravo, humilhado e inferior. Então, é compreensível que queira esconder ou anular suas origens e sua cor. Os colegas de classe dessa criança, pertencentes a outras raças, aprenderão o mesmo conteúdo racista, desencadeando todo um processo de preconceito étnico e racial. As escolas ensinam que os negros foram escravos e que, no dia 13 de maio de 1888, a princesa Isabel do Brasil e o conselheiro Rodrigo Augusto da Silva assinaram a Lei Áurea extinguindo assim, a escravidão no Brasil. Mas, a abolição não ocorreu efetivamente, pois, ainda hoje, o negro é visto como subalterno e de raça inferior. E, as principais mantenedoras deste "status quo" é a educação e a mídia.

Bibliografia:

FERNANDES, Florestan, O Mito Revelado, art. Publicado em Folhetim de São Paulo, 1980, reeditado na Revista Espaço Acadêmico Ano II nº 26 – 2003.
GUIMARÃES, Antonio Sérgio. Classes, raças e democracia. São Paulo: Editora 34, 2002.
DA MATA, Roberto – “A Fábula das 3 Raças ...” in Relativizando. RJRocco, 1987